terça-feira, 16 de julho de 2013

O dia em que falei com o Renato Russo - E quem era o Edson amigo dele?


Outro dia, nossa querida Nina Lemos publicou uma história sobre como ela entrevistou o Renato Russo com algumas mentirinhas. Na hora ri porque lembrei da minha história com uma pequena mentira também contada pra poder chegar perto dele. Afinal, Cazuza e Renato Russo eram os maiores ícones do rock no final dos anos 80 início dos 90, e neste ano tinha apenas 15 anos e muita vontade de falar com um “ídolo”. Entender suas músicas, e revoltar-se com o mundo da mesma forma como eles se revoltavam, era normal em mentes juvenis ávidas por rebeldia e descontentamento com a sociedade e mundo a sua volta. “Mãe, sua piscina está cheia de ratos”, lembro-me perfeitamente dizendo isso a minha mãe que estava desesperada por eu não ter chegado a tempo dos fogos de ano novo, não por culpa minha, mas por culpa de um trânsito infernal no trajeto Santos-Mongaguá. Foi lá que conheci um menino chamado Marcelo, lindo. Olhos verdes. Ariano (difícil, heim eu ficar com um ariano, talvez o único). Fiquei com ele, e uns dias depois ele e uns amigos muito bacanas perguntaram se iria ao show do Legião  em Campinas. Ele era de Itu e queriam muito ir.“Noooooossaaaa!!!! Quero muito ir”, falei. “Então está fechado. Posso convidar uma amiga que também ama Legião Urbana?”. Fomos todos. Era 10 de outubro de 1990. Tínhamos 15 anos e minha vida e a da Dani nunca mais seria a mesma. O show foi no ginásio do Guarani. Como éramos ainda novatas de shows, ficamos na arquibancada, que de certa forma, era perto também e tínhamos uma visão completa de tudo que se passava pelo palco. Lembro-me perfeitamente da camisa branca do Renato Russo, das rosas vermelhas, de como ele se contorcia no palco na cover de Sisters of Marcy, Jesus e outras que ele fez, e de alguém pisou no meu dedo. Nossa, como doeu. Meu colega Marcelo nos deixou em casa. Estávamoshipnotizadas. A única coisa que pensávamos era “precisamos conhecer esse cara”.Mas não pergunte por quê. Não sei... Coisas de adolescentes, que achavam que acabaram de encontrar seu salvador, provavelmente. Ainda mais que ele cantava Jesus, Sisters e Joy Division. Tínhamos acabado de ler uma reportagem sobre o Renato Russo na Veja, em que estava se declarando publicamente gay. Nela estava seu nome completo, o nome de sua mãe, e de seu pai, sabíamos, logicamente. Não foi difícil para duas garotas em não muita sã consciência sair caçando pela lista telefônica e serviços de auxílio à lista o telefone dos pais de Renato Russo. Achamos, depois de umas cinco tentativas. Conseguimos um telefone de Brasília e um da Ilha do Governador, locais onde a família possuía casa. Liguei.

“Alô, quem fala?”

“Quer falar com quem?”

“Queria falar com a Dona Carminha”.

“Dona Carminha, telefone pra senhora”.

Pronto. Lá estava feita a tentativa correta.

“Olá, Dona Carminha. Aqui é a Bia Abramo, da Bizz” – aqui está minha mentira para conseguir chegar ao Renato e desculpe, Bia, pelo uso de seu nome em vão. “Estou procurando pelo Renato para uma entrevista. A senhora sabe onde eu posso achá-lo?”.

Dona Carminha sempre foi muito gentil e educadíssima e atenciosa me explicou que o Renato estava morando em um apart no Rio, no Marina Palace.

Pronto. Lá se vai mais uns serviços de auxílio à lista, e pronto. Encontramos.

“Por favor, Renato Manfredini Júnior”.

“Um minuto, por favor”.

Nossa, passaram a ligação. O sangue corria por todas as parte do corpo. A adrenalina, percorria cada centímetro de minha boca. Só tive essa sensação três vezes com essa intensidade na vida – a primeira quando subi ao palco pela primeira vez para apresentar uma peça de teatro. A segunda quando desci uma onda perfeita em Itamambuca com uns 14 anos, e esta quando o telefone do quarto do apart do Renato Russo tocou e atendeu.

“Alô, quem é?”, uma voz de um garoto meio afeminada soou do outro lado.

“Oi, é a Márcia de São Paulo”, aqui não tinha mais porque ficar mentindo e falei quem era de verdade. “Eu queria falar com o Renato. Ele está aí?”.

“Renato, é a Márcia, sua amiga de São Paulo”.

“Renato, é a Márcia. Não sou sua amiga, mas tudo bem?”

“Tudo bem, e você? Quem é você?”.

“Eu e uma amiga minha, a Dani, gostamos muito de você. Fomos semana passada ao seu show e queríamos que você nos desse um conselho”. Com a cabeça completamente atordoa foi a primeira coisa que apareceu para tentar puxar conversa.

“Olha, eu estou saindo para ir a um show. Vai ser uma homenagem ao Cazuza, sabe? Mas faz o seguinte. Reza, Reza bastante”.

“Está bom. Obrigada. Vou rezar”. Quase não conseguia falar.

Na sequência, a voz que havia atendido primeiramente o telefone voltou a falar. “Então, a gente vai sair, mas depois a gente conversa, tá?”.

“Tá. Obrigada”.

A sala lá de casa era pequena para as rodadas que demos no chão de tanta alegria. Não nos contínhamos de ter conseguido falar com o Renato Russo, um “deus” para os adolescentes e jovens adultos na época, e que de certa forma, ele tinha sido educado e bacana.

Psicas como éramos, logicamente não parou apenas nesta ligação. No dia seguinte, lá estávamos nós novamente, tentando falar com ele. Conseguimos falamos com ele, e depois com seu amigo e companheiro de apart hotel, o Edson, que nos atendeu feliz e nos contou como havia sido a homenagem ao Cazuza. “Acho que ele gostou da gente”, pensávamos na época, uma vez que ao invés de ficarmos amiga de Renato Russo como gostaríamos, ficamos mesmo amigas de seu amigo Edson.

Nós ligávamos, ele nos atendia e conversávamos minutos e minutos, ele nos mostrava gravações de shows, um do Jockey, eu lembro bem... ou seja de 30 a 60 minutos, em média, tempos que foram suficientes para vir contas absurdas de telefone e termos que vender nossas roupas para pagá-las e escondê-las de nossos pais. Mas éramos muito inteligentes, como o próprio Renato disse – “Vocês são muito espertas, heim, meninas”. Depois do dia em que contamos a ele como havíamos conseguido seu telefone, nunca mais o nome Manfredini contou no serviço de informações 102. Talvez não éramos tão espertas assim... não deveríamos tê-lo contato nossa estratégia. Mas o fato é que falamos com Renato mais umas duas ou três vezes. Com Edson era quase todos os dias. Em 23 de outubro de 1990, seu aniversário, ele nos contou:

- Hoje é meu aniversário. Estou fazendo 21 anos”, e todo feliz comentou que Renato havia lhe dado um presente. “Ele me deu um sapato super bonito”. Não sabíamos ao certo que tipo de relacionamento existia entre eles. Também não nos importávamos com isso. O que o Edson nos contou é que eles haviam se conhecido num supermercado. Não me lembro ao certo se ele era empacotador, ou empurrava carrinhos. Também não sabemos se a história era verdadeira. Mas o Ed, como nós o chamávamos, passou a nos ligar com uma certa frequência também. A partir daí não conseguimos mais falar com Renato, e conversávamos apenas com seu amigo. Até que um dia, ele nos liga, a cobrar de alguma cidade do Nordeste, acho que estava em Recife, dizendo que estava em uma turnê do Legião Urbana e que iria nos ligar na volta, quando chegasse em Cumbica (SP). Os locais eram verdadeiros, afinal na conta do telefone ficaram todas registradas as ligações a cobrar. “Vou descer em Cumbica e depois vou até Campinas. Quero visitar vocês”. Não sabíamos se ficávamos felizes ou tristes. Mas, aos 15 anos, sem nenhuma experiência, morremos de medo do que poderia vir pela frente. E bem ou mal, minha mãe, Lenir, que já estava ficando íntima do Ed também, de tanto que ele ligava não deixou mais que atendesse às ligações dele à cobrar. Isso que ela nem sabia que ele estava vindo para Campinas. Ele chegou em Cumbica e ligou...

Não atendemos. Minha mãe não deixou eu falar. A partir daí não sabemos mais o que lhe aconteceu... ele sumiu. O Renato também sumiu. Ligamos várias vezes para Hotel Marina e nada. Ligamos para sua mãe e nada. Chegando o Natal, pensamos “ele deve fazer uma visita à mãe”. Ligamos e ele nos atendeu...

- Oi, Renato. Tudo bem? A gente queria saber se você está bem e saber o que aconteceu com o Edson...do outro lado, uma voz brava e exaltada:

- Não sei! O Edson morreu! Não me liguem mais.
 

Acabara de receber um fora de Renato Russo. Lógico, não lhe procuramos nunca mais. Não sabíamos ainda na época que ele estava com AIDS. Mas depois ficamos sabendo que a notícia lhe veio bem neste período, e ficamos nos perguntando se o Edson realmente havia morrido ou se foi uma desculpa que o Renato achou para nós. Até hoje gostaríamos de saber onde ele foi parar. Perguntei em 2011, ao Dado (O Villa-Lobos) se ele sabia do Edson, mas ele não se lembrava...

Mas ainda gostaria de saber o que aconteceu com ele. Espero se alguém ler este post possa nos explicar quem foi e o que aconteceu com o Edson depois de novembro de 1990. Rezemos, rezemos bastante! ;)

 

 

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