sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O que quer o rock alternativo?

Por Márcia Raele
A cobertura do Autorock 2008 acaba por aqui. E fica no ar uma questão: qual objetivo das bandas de rock alternativo atualmente? Será que ainda existe alguma paixão em tocar rock ou é apenas um desejo de estrelato, como disse Daniel ET do Muzzarelas e idealizador do festival, “seja ele no mainstream ou no underground (aí o nome é hype)”?
Na palestra sobre rock independente, ET explicou que o objetivo do Autorock é resgatar a tradição de Campinas em festivais de música alternativa, já que aconteceu na cidade um dos primeiros e principais nesse gênero no Brasil, o JuntaTribo. De lá saíram muitas bandas do anonimato, como Raimundos, ou mesmo Planet Hemp. Os festivais nasceram exatamente para dar esse incentivo e visibilidade para bandas que ainda não atingiram certo grau de sucesso. Mas será que esse sucesso é gratuito? Qual a diferença das bandas que estavam começando na época do citado JuntaTribo com algumas de agora que tocaram no Autorock?
O próprio Daniel ET, em entrevista a essa que vos escreve, resume bem uma pequena situação... “Só tocava quem era muito apaixonado mesmo, pois tirando a satisfação pessoal e de um pequeno grupo de amigos, ninguém tinha a pretensão de chegar a lugar nenhum. Ninguém esperava tocar no rádio, na tv, ganhar fama e fortuna. Hoje tem gente que já começa a tocar, com a cabeça num pseudoestrelato”.
Fernando, da banda SuperDrive e No Class, em entrevista ao nosso caro colega Rafael Martins, também se sente um pouco saudosista por ter vivenciado a época onde tudo começou. “Existia um intercâmbio legal entre as bandas. Por carta, a gente mandava dinheiro e recebia as demos. Era diferente, todo mundo ia ao show de todo mundo. Acho estranho hoje – todo muito quer tocar, mas não quer tocar no show do outro. E não era de mesmo gênero. Tocávamos com o pessoal do rock, do reggae, do metal. Sei lá... acho que isso é saudosismo de quem viveu na época”.
Nostalgia à parte, a verdade é que realmente a divulgação era feita entre os amigos e em fanzines, os shows conseguidos da mesma forma, o que dava um caráter muito mais de amizade do que qualquer outro tipo de intenção. Talvez pela inocência da juventude daqueles tempos, é possível – se bem que já existiam alguns velhinhos do rock independente lá no meio –, talvez realmente pela paixão pela música. Se assim for, um salve aos nossos queridos amigos que conseguem manter esse espírito vivo até hoje.
ET você é um deles. Mantém em seus projetos, shows, festivais essa chama acesa de alguma forma (leia entrevista completa com ET abaixo).
É lógico que isso também é uma forma de ganhar a vida, e seria bom que todos pudessem conseguir o mesmo. Mas confesso que me causou certo desconforto ir a uma palestra com título de Rock Independente e ver algumas pessoas ensinando outras a como fazer seu merchandising, sua assessoria de imprensa, a como achar programas de sons na internet. A impressão que tive – e talvez porque quando leio um título palestra sobre rock independente minha expectativa relaciona-se a algo “mais romântico da coisa” – foi como que o mais importante e o que deveria vir primeiro seriam essas questões e não a música em si.
Sou jornalista e assessora de imprensa, trabalho com marketing também, e sei bem o quanto isso é necessário à sobrevivência de qualquer negócio, seja esse uma banda ou não. Porém, no mundo do rock independente, pelo menos há alguns anos, esse nome tinha um certo glamour – aquele de amor pela música e de fazer as coisas acontecerem por esforços próprios, o Do It Yourself. Sempre acreditei nisso e é por isso que esse espaço, e aquilo que já foi um zine impresso, se chama Done. Não que não ache importante sair atrás de imprensa, merchan, etc. Não que ache que as bandas não devam fazer sucesso e ganhar dinheiro com isso. Pelo contrário! Todas deveriam estar muito ricas, pelo simples fato de tocarem música própria, pois, afinal, arte (parodiando aquilo que virou ditado popular) não tem preço. Mas não dá para pensar nesses itens em preferência à qualidade musical ou a estar fazendo aquilo que gosta. Sou saudosista, romântica, o que for, mas gosto de música de qualidade. E receitas nenhuma de marketing fazem sobreviver bandas por muito tempo se não tiverem um pingo de consistência musical (e o inverso também é recíproco). É isso. Leiam abaixo trecho da entrevista de Guy Piccioto (guitarrista do Fugazi) ao zine / site Dissonância já há alguns anos e acima a entrevista do ET para Donezine-Autorock, e pensem nisso.

[Fazendo um break – falando com meu amigo Luizinho esses dias via MSN, ele comentou assim ...“estou em Los Angeles terminando um disco novo. Surgiu uma oportunidade de voltar ao mainstream”. Essa é uma pessoa que no mainstream ou não sempre terá a paixão em tocar (o vi começando a tocar, o vi aperfeiçoando suas habilidades no baixo, o vi preocupado com a qualidade do som quando estava no mainstream)].

Dissonância - O que você acha da indústria musical em seu atual momento? Você acredita que a Internet facilitou a vida de bandas independentes para mostrarem seus trabalhos?
Guy Picciotto - Eu, honestamente, não penso ou me preocupo com a indústria musical de forma alguma... realmente quero que se foda. Eu acredito que a música sempre estará conosco porque ela atinge a alma de maneira tão poderosa e é uma expressão igualmente poderosa – a indústria que se formou em volta apenas pega carona nisso e as atuais condições dela não tem muita importância para mim. Bandas sempre têm a opção de escolher até que ponto querem operar dentro dessa indústria – algumas bandas sentem que é indispensável trabalhar dentro desse sistema. Outras só querem encontrar um espaço para criar com liberdade...tudo depende do que é importante para você. Para o Fugazi, autonomia era importante então nos protegemos e simplesmente fizemos o necessário para nos mantermos livres. A Internet é apenas uma ferramenta – não há dúvida que é uma maneira poderosa de espalhar informação para grandes quantidades de pessoas e que pode ser usada de formas muito legais. Mas a Internet não vai escrever uma canção brilhante para você – ela não vai providenciar a inspiração que determina uma grande afirmação criativa ou um grande movimento social. Essas coisas vêm de outro lugar, um lugar humano. (www.dissonancia.com)

Um comentário:

Gláucia Santinello disse...

q exemplo belo q vc postou..

ai, saudades!